A COMERCIALIZAÇÃO AGRÍCOLA NO TEMPO DO FIO-DE-BIGODE
Artigo publicado no Jornal Diário Popular de Pelotas-RS,
em 17.02.1993, sob Jone Tebar, Presidente da Associação
de Produtores Rurais da Florida-Canguçu-RS
Temos acompanhado com espanto a maneira como ainda se processa a comercialização dos produtos agrícolas na Zona Sul.
Como já estamos adentrando na época do agribussiness, do marketing, das telebolsas e das “safras e mercados”, é de se estranhar que na região, a comercialização agrícola se processa ainda como no tempo do fio-de-bigode.
No caso do pêssego, o produtor entrega a fruta na indústria sem nenhum recibo, contrato ou qualquer outro documento que lhe diga qual será o preço, o peso ou quando irá receber o resultado de sua safra. No contato com os persicultores, verificam-se que muitos ainda não receberam o dinheiro referente à safra passada, isto que a safra atual já está quase no seu final. No entanto, o mais incrível nisto tudo é que estes mesmos produtores, apesar de há anos sofrerem este tipo de exploração, não esboçam o menor sinal de reação, para corrigir de uma vez por todas esta situação. Antes, pelo contrário, passam à situação de conformidade, ou melhor, quando são instados a buscar a solução pela via jurídica, repelem de pronto: - Não! Se nós recorrermos à Justiça, não vamos ter a quem entregar a próxima safra. E aí passam a ficar credores, agora não mais de uma, mas de duas safras.
Por outro lado, também temos observado que este sistema de negociação não é privilégio apenas do pêssego, mas sim de todos os produtos agrícolas de nossa região (milho, cebola, arroz, batata etc).
Tivemos a oportunidade de observar ao longe, como se processa a fixação do preço do dia para a cebola em São José do Norte. Enquanto a cebola esquentava sob um sol de verão na Praça da Cebola, em cima de reboques de tratores ou pick-up Willys, sem nenhum tipo de classificação, já na mão de atravessadores, prepostos de atacadistas do Rio de Janeiro e Salvador, cheios de correntes e medalhões de ouro no peito, sentavam-se à mesa de um restaurante para o regabofe. Após algumas conversas entremeadas por garfadas, levantavam-se e dirigiam-se aos interessados que os aguardavam, dizendo que o preço da cebola naquele dia era só tal.
Este sistema arcaico de comercialização tem levado a reduzir drasticamente a renda dos produtores rurais. Ainda podemos citar os preços na época da colheita, que atinge valores irrisórios, como os do feijão, que na colheita em janeiro/92 era comercializado a Cr$12.000,00 por saco, e em novembro/92, na época de escassez era vendido a Cr$ 240.000,00 por saco. O milho, da mesma forma, na colheita, em abril/maio/92, valia, em nível de produtor, Cr$ 3.500,00/saco, e em novembro/92 já atingia Cr$80.000,00 por saco.
O arroz, embora sendo cultivado por produtores mais esclarecidos, também sofre do mesmo problema. . Vejamos o exemplo de um produtor, que mesmo tendo colhido 140 sacos por hectare, já seco e limpo, teve que desembolsar como custo da terra e água, limpeza, secagem e armazenagem 70 sacos por hectare. Como o custo dos insumos e práticas culturais também atingiu 70 sacos por hectare, acabou não lhe sobrando nada de uma excelente colheita.
Estes exemplos são ruins tanto para o comerciante industrial como para o produtor. Tais sistemas podem ser comparados ao do carrapato em cima do couro de boi magro, que de tanto sugá-lo acaba matando-o. Do mesmo modo no caso da produção agrícola da região sul, de tanto o comerciante ou o industrial sugar o produtor acaba mandando-o para a cidade, mas aí, com o tempo, o comerciante ou o industrial acaba também parando com o seu negócio. Ou, como já ouvimos dizer, “acabam matando a galinha dos ovos de ouro”.
Nos dias de hoje, já temos exemplos profícuos, como os da integração de suínos e aves em Santa Catarina e na região norte do Rio Grande do Sul, onde produtor e comerciante/industrial procuram modernizar as suas relações comerciais e de produção. No sistema integrado todos ganham, inclusive aumentam o seu potencial de competição, até junto ao mercado internacional. Outra alternativa é o sistema associativo, onde através da união dos produtores, estes podem chegar, por sua conta, ao beneficiamento e comercialização da produção.
Vamos, pois, produtores, comerciantes e industriais, espelhando-nos no tempo do fio-de-bigode, projetarmo-nos para o futuro.
Artigo publicado no Jornal Diário Popular de Pelotas-RS,
em 17.02.1993, sob Jone Tebar, Presidente da Associação
de Produtores Rurais da Florida-Canguçu-RS
Temos acompanhado com espanto a maneira como ainda se processa a comercialização dos produtos agrícolas na Zona Sul.
Como já estamos adentrando na época do agribussiness, do marketing, das telebolsas e das “safras e mercados”, é de se estranhar que na região, a comercialização agrícola se processa ainda como no tempo do fio-de-bigode.
No caso do pêssego, o produtor entrega a fruta na indústria sem nenhum recibo, contrato ou qualquer outro documento que lhe diga qual será o preço, o peso ou quando irá receber o resultado de sua safra. No contato com os persicultores, verificam-se que muitos ainda não receberam o dinheiro referente à safra passada, isto que a safra atual já está quase no seu final. No entanto, o mais incrível nisto tudo é que estes mesmos produtores, apesar de há anos sofrerem este tipo de exploração, não esboçam o menor sinal de reação, para corrigir de uma vez por todas esta situação. Antes, pelo contrário, passam à situação de conformidade, ou melhor, quando são instados a buscar a solução pela via jurídica, repelem de pronto: - Não! Se nós recorrermos à Justiça, não vamos ter a quem entregar a próxima safra. E aí passam a ficar credores, agora não mais de uma, mas de duas safras.
Por outro lado, também temos observado que este sistema de negociação não é privilégio apenas do pêssego, mas sim de todos os produtos agrícolas de nossa região (milho, cebola, arroz, batata etc).
Tivemos a oportunidade de observar ao longe, como se processa a fixação do preço do dia para a cebola em São José do Norte. Enquanto a cebola esquentava sob um sol de verão na Praça da Cebola, em cima de reboques de tratores ou pick-up Willys, sem nenhum tipo de classificação, já na mão de atravessadores, prepostos de atacadistas do Rio de Janeiro e Salvador, cheios de correntes e medalhões de ouro no peito, sentavam-se à mesa de um restaurante para o regabofe. Após algumas conversas entremeadas por garfadas, levantavam-se e dirigiam-se aos interessados que os aguardavam, dizendo que o preço da cebola naquele dia era só tal.
Este sistema arcaico de comercialização tem levado a reduzir drasticamente a renda dos produtores rurais. Ainda podemos citar os preços na época da colheita, que atinge valores irrisórios, como os do feijão, que na colheita em janeiro/92 era comercializado a Cr$12.000,00 por saco, e em novembro/92, na época de escassez era vendido a Cr$ 240.000,00 por saco. O milho, da mesma forma, na colheita, em abril/maio/92, valia, em nível de produtor, Cr$ 3.500,00/saco, e em novembro/92 já atingia Cr$80.000,00 por saco.
O arroz, embora sendo cultivado por produtores mais esclarecidos, também sofre do mesmo problema. . Vejamos o exemplo de um produtor, que mesmo tendo colhido 140 sacos por hectare, já seco e limpo, teve que desembolsar como custo da terra e água, limpeza, secagem e armazenagem 70 sacos por hectare. Como o custo dos insumos e práticas culturais também atingiu 70 sacos por hectare, acabou não lhe sobrando nada de uma excelente colheita.
Estes exemplos são ruins tanto para o comerciante industrial como para o produtor. Tais sistemas podem ser comparados ao do carrapato em cima do couro de boi magro, que de tanto sugá-lo acaba matando-o. Do mesmo modo no caso da produção agrícola da região sul, de tanto o comerciante ou o industrial sugar o produtor acaba mandando-o para a cidade, mas aí, com o tempo, o comerciante ou o industrial acaba também parando com o seu negócio. Ou, como já ouvimos dizer, “acabam matando a galinha dos ovos de ouro”.
Nos dias de hoje, já temos exemplos profícuos, como os da integração de suínos e aves em Santa Catarina e na região norte do Rio Grande do Sul, onde produtor e comerciante/industrial procuram modernizar as suas relações comerciais e de produção. No sistema integrado todos ganham, inclusive aumentam o seu potencial de competição, até junto ao mercado internacional. Outra alternativa é o sistema associativo, onde através da união dos produtores, estes podem chegar, por sua conta, ao beneficiamento e comercialização da produção.
Vamos, pois, produtores, comerciantes e industriais, espelhando-nos no tempo do fio-de-bigode, projetarmo-nos para o futuro.
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